ARTIGO – Do ABC ao Tigrinho, o perigo silencioso da Educação

  • Renata Abreu

O Brasil atravessa uma crise educacional que se revela em dois extremos. Na base, crianças que não conseguem aprender a ler e escrever. No topo, jovens que trocam a universidade por apostas online. Estamos falhando no básico. E permitindo que o vício se sobreponha à formação.

Em 2024, apenas 59,2% das crianças da rede pública foram consideradas alfabetizadas ao fim do 2º ano do ensino fundamental. A meta era 60%. E só 11 estados atingiram esse mínimo. E o objetivo nacional, de chegar a 80% até 2030, parece cada vez mais distante. Uma criança é considerada alfabetizada quando consegue ler pequenos textos e escrever bilhetes simples — ainda que com erros.

Enquanto isso, a juventude também se distancia da sala de aula, mas por um motivo diferente e igualmente alarmante: as apostas online, como o “jogo do tigrinho”. Segundo pesquisa da Abmes e da Educa Insights, 34% dos jovens entre 18 e 35 anos deixaram de ingressar no ensino superior em 2025 por causa dos gastos com apostas.

A estimativa é de que cerca de 986 mil potenciais estudantes tenham adiado seus sonhos por esse motivo. De acordo com a pesquisa, 52% dos entrevistados apostam regularmente, de uma a três vezes por semana. Os valores investidos variam conforme a classe social: enquanto os apostadores da classe A destinam, em média, R$ 1.210 mensais às apostas, nas classes D e E, o valor médio é de R$ 421. O impacto também atinge quem já está matriculado: 14% dos estudantes atrasaram mensalidades ou trancaram seus cursos devido aos gastos com apostas. É a ilusão substituindo o futuro.

Esse cenário não pode ser normalizado. Ele exige políticas públicas sérias, projetos de lei consistentes e, principalmente, um esforço coletivo que envolva o poder público, o setor privado e a sociedade. Tenho trabalhado incansavelmente para mudar essa realidade. Como deputada federal, propus medidas como a formação permanente dos professores para atender à diversidade nas salas de aula, incluindo alunos com autismo; a obrigatoriedade da disciplina de Educação Política e Direitos da Cidadania; e a criação de incentivos fiscais para empresas que investem na formação de seus colaboradores. Sou coautora da Lei Pé de Meia, que estabelece um incentivo financeiro-educacional para estudantes do ensino médio público, com o objetivo de combater a evasão escolar.

Mas é preciso ir além. O Brasil precisa de campanhas educativas de massa contra o vício em apostas, especialmente voltadas para jovens e adolescentes. Isso inclui campanhas nas escolas, nas redes sociais, na televisão. A CPI das Bets já demonstrou que o problema é estrutural — suas raízes não são apenas econômicas, mas emocionais e culturais. O combate precisa ser direto, consciente e articulado.

Na base do sistema, é urgente investir na formação dos professores, na infraestrutura escolar, no material didático e no envolvimento das famílias. Se a Educação não começa bem, ela não termina bem. E se a base falha, todo o edifício social desmorona. Educação não é só o caminho para o futuro — é o alicerce do presente. Sem ela, perdemos nossos jovens para o improviso, para a promessa fácil, para o vício disfarçado de diversão. Com ela, ganhamos cidadãos preparados, trabalhadores conscientes e uma sociedade mais justa.

A Educação precisa ser prioridade real. De todos nós. Todos os dias!

  • Renata Abreu é deputada federal por São Paulo e presidente nacional do Podemos.

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