Quando chegamos na Câmara dos Deputados, em 2015, não trouxemos apenas propostas. Levamos uma convicção que nos acompanha até hoje: educação de qualidade é a escolha mais estratégica que um país pode fazer. Não se trata de uma bandeira circunstancial, nem de um discurso eleitoral. Trata-se de definir que tipo de sociedade queremos construir e quem queremos formar para liderar o nosso futuro.
Ao longo dos nossos três mandatos seguidos, essa convicção se transformou em projetos de lei, defesa pública, articulação política e trabalho permanente dentro do Parlamento, sempre com o objetivo de fortalecer uma educação mais humana, mais inclusiva e mais conectada com a vida real .
Agora, quando estamos debatendo no Congresso Nacional o novo Plano Nacional de Educação (PNE), que vai traçar os rumos da educação brasileira pelos próximos dez anos, fica claro que essa visão que defendemos desde 2015 não está à margem do debate. Pelo contrário: ela está dentro do coração do PNE.
O plano traz diretrizes que falam de formação integral do estudante, fortalecimento da aprendizagem, valorização dos profissionais da Educação, combate à evasão, educação inclusiva, infraestrutura escolar e redução das desigualdades educacionais. São exatamente os pilares que nortearam os projetos que apresentamos ao longo desses quase 10 anos de atuação parlamentar, voltados ao reforço escolar contínuo, ao desenvolvimento das competências socioemocionais, ao ensino de Educação Cidadã, à inclusão de alunos com deficiência, ao atendimento educacional especializado, à proteção dos professores e à valorização do ensino público .
Mas se o Brasil quer que o novo PNE não seja apenas um documento bem escrito, e sim uma política real e transformadora, precisa olhar para exemplos concretos de quem decidiu executar e não apenas prometer. E é aqui que entra a experiência da Estônia.
Em maio, tive a oportunidade de ir à Estônia para conhecer de perto uma das maiores revoluções educacionais do nosso tempo. Um país pequeno, com pouco mais de 1,3 milhão de habitantes, que nos anos 90 enfrentava graves dificuldades econômicas após sair de décadas de dominação soviética, decidiu colocar a Educação no centro do seu projeto nacional. Não como retórica, mas como prática.
Em 1996, o governo estoniano entendeu que a internet mudaria profundamente o mundo e, já em 1997, levou computadores e conexão para todas as escolas do país. Não como modismo tecnológico, mas como uma política estruturante de formação para a vida digital que viria.
Hoje, a Estônia lidera a educação na Europa no ranking do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) e é referência mundial em educação pública de qualidade. Seus alunos têm desempenho alto independentemente da condição social, porque o sistema é inclusivo, oferece apoio pedagógico, psicológico e social dentro da escola e parte de uma mentalidade simples e poderosa: ninguém fica para trás.
Lá, a missão da escola não é formar decoradores de conteúdo, mas cidadãos autônomos, capazes de pensar, resolver problemas, trabalhar em equipe e compreender o seu papel no mundo. Professores são valorizados, com formação em nível de mestrado, remuneração digna e autonomia pedagógica real. As escolas não são engessadas por burocracias inúteis; elas têm liberdade para escolher métodos, organizar espaços e adaptar estratégias de ensino, sempre seguindo diretrizes nacionais bem definidas e monitoradas com seriedade.
O resultado não é apenas uma boa colocação em ranking internacional. A Estônia é hoje um dos países mais digitais do mundo. Mas o principal é que essa transformação começou pela escola. Começou pela decisão de formar pessoas, não só trabalhadores, mas cidadãos completos.
É exatamente essa mentalidade que o Brasil precisa incorporar de forma séria enquanto discute o novo Plano Nacional de Educação. Determinação e execução. Porque plano, por si só, não transforma nada. O plano só se torna instrumento de mudança quando há vontade política real, continuidade, investimento adequado e cobrança permanente.
Nos últimos anos o Brasil tratou o PNE como uma carta de intenções. Muitas metas ficaram no papel por falta de prioridade, por descontinuidade administrativa e por ausência de compromisso de Estado. Educação não pode mudar ao sabor de governos. Ela precisa ser política permanente, protegida das disputas conjunturais e sustentada por um pacto nacional.
O novo PNE é uma oportunidade histórica de corrigir essa rota. Mas ele só fará diferença se vier acompanhado da coragem de executar, da seriedade de monitorar e da maturidade de entender que Educação não é gasto, é investimento. Cada criança que abandona a escola, cada professor desvalorizado, cada jovem que não aprende o básico representa um país que falha com o próprio futuro.
A Estônia provou que não é o tamanho do país nem a riqueza inicial que definem o sucesso educacional, mas a clareza de propósito, a continuidade das políticas e o compromisso com a formação humana. O Brasil já tem diagnóstico, já tem propostas, temos um plano sendo debatido no Congresso. O que falta agora é transformarmos a intenção em ação.
E essa continuará sendo a nossa luta, como foi desde o primeiro dia em que pisamos no Congresso: defender uma educação pública forte, inclusiva, humana e transformadora, capaz de preparar nossos jovens não apenas para o mercado, mas para a vida, para a cidadania e para o futuro. Porque educação de verdade não se mede apenas por números, mas pelo tipo de sociedade que ela constrói.
- Renata Abreu é presidente nacional do Podemos e deputada federal por São Paulo
